Belarmino era casado e tinha dois filhos, eram emigrantes num país qualquer...
Haviam-se estabelecido há vários anos, e tudo corria mais ou menos bem, quando rebentou uma revolução e o poder se tornou despótico, tendo como linha de força a exploração dos estrangeiros...
Belarmino e a sua família suportaram a submissão própria de uma escravatura até que um dia ele resolve comunicar aos seus o seu desejo de fugir... Todos sabiam que a fuga lhes podia valer ou a liberdade ou nada... e isto invadiu-lhes o espírito durante dias: ou a liberdade ou nada... até que um dia... o dia marcado, tudo estava pronto, ou melhor, todos estavam prontos, dado que não pensavam levar consigo mais do que a vontade da liberdade e a roupa... O plano era simples: tentar passar a fronteira a pé, correndo, fugindo aos mais do que prováveis tiros das tropas daquele país...
Chegaram ao fim da rua, a fronteira estava a cerca de 200 metros... tão perto e tão longe... O filho mais novo disse então:
- Vamos! Ou a liberdade ou nada!
A mulher de Belarmino chorava... O filho mais velho cerrava os lábios... tudo estava pronto...
Belarmino dá então a ordem de que seria daí a um minuto que correriam tanto quanto as suas pernas o permitissem... E que minuto tão grande... o maior que já tinham vivido...
30 segundos... nem lágrimas nem mais nada a não ser a vontade de ferro de ou liberdade ou nada...
5... 4...3... 2...1... JÁ!
E toda a família começou aquela corrida para a liberdade... começaram-se a ouvir tiros e tiros, e a família começou por perder a mãe que tinha sido o primeiro alvo bem sucedido duma qualquer espingarda, depois o filho mais novo... o mais velho e Belarmino corria sozinho, faltavam poucos metros... 3 ou 4 ... parou, levantando os braços em sinal de rendição... Os outros morriam e Belarmino de braços no ar... Rapidamente os tropas mataram toda a família à excepção de Belarmino que se havia rendido... Algemaram-no e bateram-lhe... muito!
Já no calabouço partilhado com ratazanas Belarmino chorou, chorou tanto, que não podia mais...
Não era pela sua família ter morrido... era por ele a ter desiludido... pois tendo sido o único a ter a possibilidade de liberdade não o tinha tentado até ao fim... e não sabia porquê... Agora e alí, nem liberdade nem nada... a sua família tinha alcançado o nada, ele nem uma coisa nem outra...
Remorso, arrependimento... não era nada disso, era a aterradora sensação de ter sido sentimentalmente cobarde, de estar perto e desistir...
Quando dormia sonhava sempre com o mesmo:... o filho mais novo a dizer: - Vamos! Ou a liberdade ou nada! e acordava sempre sentindo que o facto de se ter rendido, o facto de levantar os braços no momento em que o fez... o fizera perder toda a dignidade e razão de ser pai e marido... pois ele traiu os seus nesse preciso momento.
Anos mais tarde foi condenado por razões irracionais a ser fuzilado... e o seu último pedido foi o de poder ser abatido de costas e de braços ao alto... os únicos momentos em que viveu feliz foram os que se seguiram ao seu pedido ser aceite e que terminaram quando todas as balas lhe entraram dentro...
5 comments:
Que triste...e que bonito ao mesmo tempo.
Porque será que conseguimos ver beleza numa situação tão triste?
O sentimento que lhe assolava o peito devia ser fortíssimo.
Só isso o faria levantar os braços e ajoelhar-se.
Penso que o belo se deve ao que conseguimos ver para além do que está escrito.
Imaginá-lo.
Nascemos para sofrer?
Acredito em Deus e como Ele se manifesta e conduz a nossa história.... por amor! Muitas vezes, passamos a vida a fugir da mesma, sempre contrariando aquilo que nos prende ou escraviza.
O "segredo", é aceitar que nos coube um lote magnífico, que a nossa herança é a melhor.
Estranha liberdade esta que procuramos, e que nos conduz á morte e á tristeza.
Ânimo e aquele abraço.
p.s. Desafio grande, esta pergunta do Paulo. Anseio a tua resposta, oh meu mestre amigo.
Já podes ler a entrevista da Weee no meu Blog ;)
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