A esposa de João Pedro acabara de ficar grávida e se já viviam com grandes dificuldades, o amanhã do bebé adivinhava-se bem pior.
João Pedro estava desempregado por já longos 4 meses, tinha sido uma falência do escritório. A sua mulher trabalhava 12 horas por dia numa fábrica.
Quando soube da gravidez da sua mulher, o que fez foi começar a procurar emprego com cem vezes mais esforço do que aquilo que já estava a fazer.
Conseguiu ao fim de mil nãos, um sim. Tinha o problema de ser um pouco sujo, tratava-se de manutenção de esgotos, a pior parte de tal coisa. Ele ficou feliz pois o salário era relativamente bom e assim havia a possibilidade de sustentar com mais segurança aquele que se esperava.
Começou o seu trabalho no dia seguinte. Foi só ao chegar a casa que se apercebeu do estado em que estava, as roupas sujíssimas e o cheiro, um cheiro tão nauseabundo que até lhe deu vontade de rir. Sua mulher, quando chegou, fez uma cara indescritível, olhando-o de forma fria.
Passadas duas semanas, e ainda antes do primeiro salário entrar em casa, a esposa de João Pedro sentou-se diante dele e disse-lhe que aquele emprego era indigno e que aos olhos de outras pessoas até ela ficava mal vista - O meu marido trabalha nos excrementos! - E afirmou que iria separar-se dele pois a situação tinha atingido tal ponto que já só havia a solução de quebrar a relação. Saiu de casa sem o ouvir sequer, levou tudo... até aquilo que tinha no seu ventre e que não era só seu. Só deixou a morada para onde ia, isto para ele lhe enviar dinheiro (se quiseres!) e a indicação expressa para que ele não tentasse sequer voltar a vê-la.
João Pedro continuou a trabalhar no mesmo sítio... não havia nada melhor. Enviava mensalmente 3/4 do seu ordenado para a morada que ela lhe tinha deixado num bocado de papel pardo.
Completamente só, vivia para o final do mês, para o cheque que se trocava por dinheiro e este por um vale postal, que por sua vez era enviado para a morada.
Foi assim durante muito tempo. A sua (ex-)? mulher teve um filho, foi despedida antes de o ter, pois não houve compreensão para a licença de maternidade, os tempos eram de crise. Nunca mais conseguiu arranjar emprego. Vivia do vale-postal e nem o apelido do pai pôs no nome do menino... Sempre achou indigno trabalhar nos excrementos.
João Pedro viveu com cerca de 1/4 do seu salário durante muitos anos, quando era aumentado aumentava, também ele, a fatia para o vale-postal. O menino cresceu e fez-se um homem que quando se apercebeu do vale-postal procurou de imediato explicação. Não a obtinha em lado algum, mas persistindo acabou por chegar à morada remetente do papel que valia dinheiro. Era a morada de quem os sustentava a ele há anos. Pensou que era um ricalhaço qualquer, mas mesmo assim resolveu ir até ao fim, havia que ver a cara de quem enviava o crédito mensal.
Era uma barraca, junto dos vizinhos perguntou coisas e esperou para ver a cara do tal Sr. João Pedro.
João Pedro chegou, e ao fim de pouco tempo, aquele velho e o jovem (re)conheciam-se pai e filho...
Depois de horas de diálogo:
- Mas afinal, meu filho, como é que te chamas?
- Acabei de nascer à pouco e chamar-me-ei João Pedro!
O velho João Pedro morreu num acidente de trabalho ao fim de dois dias...
O jovem João Pedro saiu de imediato da casa da mãe para ir viver para a do seu falecido pai, ocupando igualmente o lugar do pai na manutenção dos esgotos. Ao sair de casa da sua mãe nada disse, só prometeu 3/4 do salário.
João Pedro, o pai, chorou... anos e anos pelo filho, por tamanha dignidade.
Chorou até sorrir quando se deu conta dos porquês da sua história.
1 comment:
... Ou seja, nem sempre quem anda "na dita" é que está "na cuja"...
É tão fácil nas histórias... Mas, pelo menos nestas, acontece assim.
Gostei!
Tó Martinho
Post a Comment